Riscos da fragmentação artificial de empresas para permanência no Simples Nacional

25 SET 2025

Riscos da fragmentação artificial de empresas para permanência no Simples Nacional

O expediente amplamente utilizado de abertura de diversas empresas em nome de terceiros para manter a tributação favorecida do Simples Nacional (SN), pode estar com seus dias contados. Diversos acórdãos recentes do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e decisões do Superior Tribunal de Justiça demonstram tratar-se de artifício que configura forte risco tributário.

Cada vez mais munido de informações oriundas dos documentos e arquivos digitais, o Fisco estadual vem detectando mais rapidamente tais operações e caracterizando-as como formação de grupo econômico de fato, com a consequente exclusão retroativa do regime do SN e exigência de ICMS pelo regime normal, acrescido de multa e juros.

1. O quadro fático revelado pelos acórdãos

Os julgados analisados revelam padrões comuns: constituição de várias empresas formalmente distintas, mas com mesma estrutura administrativa e operacional, controle centralizado, sócios com vínculo familiar ou de confiança e, muitas vezes, uso de interpostas pessoas (“laranjas”) para encobrir os verdadeiros administradores. Em alguns casos, as empresas funcionavam no mesmo pavilhão, compartilhando funcionários e recursos, ou mantinham marca, site e gestão únicos, embora registradas como autônomas.

Em todos os casos houve o reconhecimento de grupo econômico com o fracionamento do faturamento entre empresas familiares, com indícios de simulação desde a sua criação, pois, de fato, atuavam como se fossem filiais, estando apenas formalmente separadas.

Em muitos processos foi identificada a unicidade administrativa e operacional, por vezes com atividades sendo exercidas em um mesmo local, com uso do mesmo uniforme e com quadro societário comum, caracterizando um único negócio explorado de forma simulada.

Assim, na análise dos processos ficava evidenciado o intuito de encobrimento dos verdadeiros sócios e administradores, caracterizando o dolo ainda que não houvesse a falsificação de documentos.

2. Fundamentos jurídicos para a exclusão retroativa

Os acórdãos analisados demonstram que a exclusão do Simples Nacional encontra respaldo principalmente:

• No art. 29, IV, da LC 123/2006, que autoriza a exclusão quando constatada a constituição de empresa por interposta pessoa;

• No art. 3º, II, §§4º, 9º e 9º-A da LC 123/2006, que veda o enquadramento quando o faturamento conjunto ultrapassa o limite legal;

• Nos arts. 124 e 135 do CTN, que permitem a responsabilização solidária das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador, ou que atuem com excesso de poderes ou infração de lei.

Além disso, os tribunais têm afastado a necessidade de incidente formal de desconsideração da personalidade jurídica, por entender que a responsabilização se dá de forma direta e pessoal pelo ilícito tributário, diante da comprovação de fraude e de grupo econômico de fato.

3. Consequências práticas e riscos

O reconhecimento de grupo econômico de fato, nos casos em que a receita total das empresas supera R$3.600.000,00 no período de 12 meses, acarreta exclusão retroativa do Simples Nacional, com a exigência do ICMS e demais tributos desde o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o limite foi extrapolado, além da aplicação de multa qualificada (até 100%), com juros e impedimento de novo ingresso no regime por dez anos. Tais efeitos podem atingir não só as empresas formalmente constituídas, mas também sócios e administradores, em razão da responsabilidade solidária.

Outra grave consequência da exclusão retroativa é a necessidade de apresentar as declarações exigidas pela RFB e pela Receita Estadual para empresas não optantes pelo Simples Nacional, e de se apurar e recolher novamente os tributos sobre os mesmos fatos geradores, com os acréscimos legais.

4. Conclusão

A tentativa de manter-se no Simples Nacional mediante a criação de várias empresas em nome de familiares ou terceiros configura, segundo a jurisprudência consolidada, simulação ilícita. A análise dos acórdãos evidencia que a Receita Estadual e o Poder Judiciário estão atentos a sinais como administração única, confusão patrimonial, interposição de pessoas e fracionamento artificial de receitas. A consequência é a exclusão retroativa do regime, com expressivos ônus tributários e patrimoniais.

Portanto, a abertura de múltiplas empresas apenas para fracionar faturamento não é uma estratégia segura. Para empresários que desejam estruturar ou expandir seus negócios, a recomendação é buscar planejamento tributário lícito, com apoio técnico-jurídico, evitando riscos de autuações, cobranças retroativas e sanções severas.

 

Referências Bibliográficas